O pão maldito

30/06/2010 at 14:31 (Hermano de Melo)

Hermano de Melo*

O pão maldito (Créditos: La Procure).

Em 1951, a pequena cidade francesa de Pont-Saint-Esprit – na época com 4,5 mil habitantes (hoje tem 10 mil) – viveu drama surrealista:um surto coletivo em que mais de 300 pessoas tiveram alucinações, 50 foram internadas em clínicas psiquiátricas e sete morreram ao comerem pão contaminado. Conforme depoimento de moradores mais antigos do vilarejo, era comum, na ocasião, ver pessoas saírem nuas à rua imitando cachorro, ou ficarem seis meses internadas num hospital psiquiátrico porque viam fogo por tudo, ou o pai que teve alucinações com uma orquestra,etc. Na ocasião, os moradores culparam pelo surto a farinha de trigo utilizada na produção do pão por uma padaria do lugar – a Briand – que, por sinal, teve que fechar suas portas alguns meses após o terrível incidente. Mas a verdadeira versão dos fatos pode ser outra. (Lúcia Müzell/Notícias Terra,01/04/2010).

Paul Lages, mecânico de 84 anos, antigo morador de Pont-Saint-Esprit é dos poucos a comentar o curioso incidente de 1951. (Fonte: Portal Terra).

Todo esse insólito episódio estaria fadado ao esquecimento se não fosse a publicação recente (2009) do livro do jornalista e escritor americano,Hank Albarelli Jr., intitulado,“Terrible Mistake”, ainda sem tradução para o português, e que breve se transformará em filme. Nele, ao investigar o misterioso assassinato do bioquímico da CIA, Frank Olson, em 1953, o autor descobriu que há uma forte ligação entre a morte do cientista americano e o lendário “caso do pão maldito” francês. Com base nisso, ele concluiu que o famoso episódio na pequena cidade francesa pode ter sido provocado deliberadamente pela agência de inteligência americana, que em plena “Guerra Fria” queria conhecer melhor os efeitos da recém-descoberta droga LSD sobre a mente humana.

Capa do livro Terrible Mistake, de Hank Albarelli Jr (Fonte: Portal Terra).

Em entrevista concedida ao site Terra (Lúcia Müzzel, 01/04/2010), Albarelli Jr. explica porque está tão certo da responsabilidade da CIA pelo surto de loucura em Point-Saint-Esprit: (…) “Havia duas bases americanas próximas àquela pequena cidade da França e a necessidade de se escolher uma cidade para a experimentação do LSD. E ela foi a escolhida”.(…) “Há relatórios que fazem menção ao fato de que a cidade era politicamente à esquerda, o que nos anos 50, plena Guerra Fria, não era bem visto pelos americanos, mas não sei se esse foi realmente o caso”. E como o LSD foi espalhado na cidade? (…) “Há uma série de documentos que falam em disseminar o produto na água ou em produtos alimentícios. Eu suponho que tenha sido através do pão, porque não há produto mais comum e que todo mundo consuma”. E por que uma padaria específica? (…) “Eu soube que a maior parte do pão contaminado saiu de uma padaria específica, e no início se acreditou numa contaminação por um fungo na farinha utilizada nesta padaria. Mas depois cientistas provaram que os efeitos não teriam sido os mesmos dos verificados nas pessoas atingidas. A CIA pode perfeitamente ter colocado o LSD na matéria-prima desta padaria”.

A mais contundente revelação feita pelo jornalista americano, porém, é quando ele diz que “não é coincidência o fato de que na semana seguinte ao incidente apareceram na pequena cidade francesa cientistas do laboratório suíço que tinha fornecido LSD para as experiências da CIA naquele ano,o Sandoz, responsável pela descoberta do LSD, em 1943”.“Eles não contaram nada disso para ninguém, eles mentiram sobre isso, porque sabiam o que estava acontecendo. Estavam suprindo a CIA e o Exército americano de LSD de 1949 até 1951, e depois retornaram com o fornecimento até 1953, quando os Estados Unidos decidiram contratar uma companhia farmacêutica americana (Eli Lilly) para produzir o LSD. O fato é que o Sandoz foi investigar o que aconteceu e eles foram uns dos que disseram que as pessoas tinham sido infectadas por veneno, mas eles sabiam que não era”. E conclui Albarelli Jr.: “As pessoas da cidade parecem acreditar que nunca vai se saber a real razão daquele surto. Eu acho que nós já sabemos”.

O desvendamento de casos como o do “pão maldito”, na pequena cidade francesa de Pont-Saint-Esprit, mesmo que tenha ocorrido ao acaso e tardiamente (59 anos depois!), é extremamente significativo por duas razões principais: primeiro, porque restabelece a verdade dos fatos e permite mesmo que simbolicamente (“in memorian”), a punição dos culpados pela morte e desequilíbrio mental de tantas pessoas inocentes; depois, porque estimula a busca da verdade em outros acontecimentos históricos, que muitas vezes são apresentados à sociedade de forma não convincente ou até mesmo mentirosa! Qual seria, por exemplo, o desfecho do famoso caso da Escola de Base em São Paulo, se a verdade, mesmo que tardia, não viesse à tona? O que aconteceu de fato na morte de Ulisses Guimarães? E na de João Goulart na Argentina? Onde está a verdade no caso Motel? E no caso Semy Ferraz (“Operação Vintém”)?

E já que o momento é de Copa do Mundo de Futebol 2010, na África do Sul, que tal pesquisar as razões que levaram a delegação francesa, inclusive os jogadores, a surtarem na primeira fase do campeonato mundial em campos africanos? Será que o Zidane tem algo a ver com isso? Ou será que colocaram alguma substancia estranha no pão deles? Que tal chamar o Sherlock Holmes para desvendar o mistério, hein?

* Professor, Escritor e Acadêmico de Jornalismo.

Artigo publicado no dia 30 de junho no jornal Correio do Estado.

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O poste eólico-solar

15/06/2010 at 13:34 (Hermano de Melo)

Hermano de Melo*

Fonte: Revista da FIEC

Quando do apagão que acometeu o Brasil em 2001, ainda no governo FHC, o engenheiro-mecânico e empresário cearense Fernando Alves Ximenes, proprietário da Gram Eolic, acreditou que era hora de buscar alternativas ao caos energético que assolava o País. Foi aí que ele bolou um projeto que só começou a dar os primeiros frutos sete anos depois e tomou corpo no final de 2009/início deste ano: um poste de iluminação pública 100% alimentado por energias eólica e solar! O poste, feito de aço e com altura que varia de 12 a 18 metros, denominado Produtor Independente de Energia (PIE), possui como peças-chave um avião de três metros de comprimento e bateria no topo.(Ilo Santiago Jr.,Diário do Nordeste, 10/11/2009;Gevan Oliveira, Revista FIEC, 06/05/2010).

O engenho funciona assim: o avião, feito em fibra de carbono e alumínio especial, tem células solares de silício em suas asas que captam os raios ultravioletas e infravermelhos, transformando-os em energia elétrica, que fica armazenada na bateria instalada logo abaixo do avião. As hélices funcionam como as pás dos moinhos de energia eólica. Quando giram impulsionadas pelo vento, elas produzem até 1000 watts de energia que também vai para a bateria. Ximenes diz que a escolha do formato de avião foi devido à sua aerodinâmica, o que facilita a captura de raios solares e de vento. “Além disso, são duas fontes de energia alimentando-se ao mesmo tempo, podendo ser instalado em qualquer região e localidade do Brasil e do mundo”, diz ele.

Estrutura do poste eólico-solar. Fonte: Revista da FIEC

Cada poste com avião (um gerador) é capaz de produzir energia para outros dois sem gerador e com seis lâmpadas LEDs (mais eficientes e ecológicas, pois não usam mercúrio como as fluorescentes compactas), de 50.000 horas de vida útil dia e noite (cerca de 50 vezes mais que as lâmpadas em operação atualmente e oito vezes mais luminosas que as convencionais). Com essas duas fontes funcionando ao mesmo tempo, o poste eólico-solar tem autonomia de até sete dias, ou seja, é à prova de apagão! O projeto gestado durante sete anos pode ser visto no Palácio Iracema (Governo do Ceará), onde passa por testes. Em maio do ano passado, foram instalados 500 postes em Patos (PB), 300 em Goiânia e 800 em Palmas (TO). (Instituto Ethos, 26/04/2010).

O empresário afirma que a economia com o sistema é de cerca de R$ 21.000 por quilômetro/mês, considerando-se a fatura cheia da energia elétrica. Além disso, o custo de instalação de cada poste é cerca de 10% menor que o convencional, isso porque economiza transmissão, subestação e cabeamento. A alternativa teria também um forte impacto no consumo da iluminação pública, que atualmente representa 7% da energia no estado. “Com os novos postes, esse consumo passaria para próximo de 3%”, garante, ressaltando que, além das vantagens econômicas, existe ainda o apelo ambiental. “Uma vez que não haverá contaminação do solo, nem refugo de materiais radioativos, não há impacto ambiental”, finaliza Fernando Ximenes.

As tecnologias limpas – aquelas que não queimam combustível fóssil – serão o futuro do planeta quando o assunto for geração de energia elétrica. Nesse sentido, a produção eólica e solar sai na frente e representa importante fatia na matriz energética de países europeus, como Espanha, Alemanha e Portugal, além dos Estados Unidos (Revista FIEC, março/2010). Na contramão da história, porém, estão países que insistem em produzir energia suja a partir do petróleo, e as consequências nefastas para o meio ambiente são visíveis. Este, por exemplo, é o caso do recente desastre ambiental na costa leste dos EUA provocado pela British Petroleum (BP) ao perfurar poço profundo no Golfo do México (prévia do que poderá acontecer na exploração do Pré-Sal tupiniquim?). Ou, ainda, de países como o Brasil, que se utiliza de madeira proveniente de matas nativas ou de florestas artificiais de eucalipto/pinheiro/etc.,para produção do carvão vegetal que abastece siderúrgicas de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e outros estados brasileiros (Folha.com/Ciência, 26/05/2010).

Não há dúvida, portanto, sobre a importância ambiental e econômica do invento do “Professor Pardal” cearense. Mas será que ele responderia à crescente demanda urbano-industrial por energia limpa nas grandes cidades brasileiras? Decerto que não. Daí a necessidade de se expandir cada vez mais no Brasil os chamados parques eólicos e as usinas solares! Assim, em agosto do ano passado, foi inaugurado o parque eólico “Praias de Parajuru”, em Beberibe, no Ceará, com capacidade de gerar 150 megawatts de energia elétrica por meio dos ventos. Além disso, prevê-se a construção de mais dois parques eólicos – um na praia de Morgado e outro na Volta do Rio – ambos no município de Acaraú, a 240 km de Fortaleza, para produzir em conjunto 42 MW de eletricidade! Somem-se a isso,outros parques eólicos existentes no País, como a Usina de Morro do Camelinho, em Minas Gerais (o mais antigo) e o de Osório, no Rio Grande do Sul. E, dentro em breve, o município de Tauá (CE) deverá abrigar a primeira usina solar brasileira! O projeto está pronto e a previsão é que as obras comecem ainda este ano. (Revista FIEC, 06/05/2010).

Enfim, embora a passos de tartaruga, o Brasil desperta para a necessidade de expandir sua produção de energia elétrica a partir de fontes limpas e renováveis que são abundantes no País (eólica e solar), deixando de lado outras sabidamente poluidoras (combustíveis fósseis), ou que provoquem fortes impactos ambientais e humanos (hidrelétricas gigantes). Quanto ao invento do engenheiro mecânico e empresário cearense Fernando Ximenes, que tal contratá-lo para iluminar os estádios de futebol na próxima Copa do Mundo no Brasil, em 2014, com direito a postes eólico-solares e aviõezinhos pintados de verde e amarelo no topo, hein?

Energia Eólica. Fonte: Revista da FIEC.

Energia Solar. Fonte: Revista da FIEC.

* Médico-Veterinário, Escritor e Acadêmico de jornalismo da UFMS.

Artigo publicado em 15 de junho no jornal Correio do Estado.

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